UA-40840920-1

domingo, 23 de fevereiro de 2014

Domingo, é no Marais!

Depois das dicas para organizarem a viagem para Paris, aposto que ficaram com vontade de aqui vir dar um saltinho e já têm as passagens reservadas. Sim, sim, eu sei que a cidade é aliciante ao máximo, não apenas para os casais apaixonados, como Hollywood insiste em mostrar, mas também para qualquer espírito viajante, que gosta do pequeno e do grande, “à francesa”, expressão que entenderão passeando por estas bandas, como dizia uma amiga minha. Se apanharem um domingo que não seja o primeiro do mês, dos museus gratuitos, ou simplesmente se não quiserem estar enfiados num espaço apenas durante todo o dia, vão por mim: Domingo, é no Marais!


O Marais, durante vários séculos, foi o bairro favorito da aristocracia, que nele montou as suas mansões. Os “Hôtels” que virem por aqui não são hotéis de hoje em dia, para pernoitar, mas sim casas sumptuosas onde habitavam famílias endinheiradas e que são, actualmente, museus e espaços de visita. Só pela imponência das casinhas dos nobres de antigamente, já valeria dar um pequeno passeio pela região. Mas o Marais é muito mais!

Após a mudança da nobreza para a região de Faubourg-Saint Germain, do outro lado do rio, e pertinho da famosíssima Torre Eiffel e do seu idílico Champs de Mars (perto do qual encontramos, por exemplo, o Museu Rodin, casa de  Abraham Peyrenc de Moras, pessoa abastada ligada ao mercado financeiro no final do século XVIII, início do XIX), o Marais foi descoberto pela comunidade judaica que, até à mancha escuríssima que foi para a história da Humanidade, dita racional, o regime nazi (e que, infelizmente, não reina sozinha no mundo do horrível e do que causa vergonha ao mais desligado ser humano), aí prosperou e cresceu. No final da guerra, tínhamos um bairro destituído da vida que outrora albergava, agora remetido a região operária.

Sendo uma das regiões mais fustigadas pelos ataques, temos, nos anos 50, um Marais ferido e a necessitar de reparações profundas, que fez com que DeGaulle o considerasse, já nos anos 60, um sector a ser salvaguardado e recuperado, dada a sua importância cultural. Seguem-se os restauros. As antigas mansões albergam hoje museus e um dos seus espaços, deu lugar à região onde vemos agora um dos monumentos de visita obrigatória, o Centro de Arte Moderna Georges Pompidou.   

Pondo a parte histórica de lado, porque é importante saber como chegámos ao bairro fantástico que temos hoje, mas não é apenas isso que lhe dá o brilho, encontramos, actualmente, um Marais onde afluem e se encontram as comunidades judaica, gay, chinesa, com o toque artístico dado pelas várias galerias pelas quais por lá passamos. As lojas mais famosas, hypes, algumas exclusivas, têm morada pelas ruas onde outrora os nobres se passeavam, mostrando que se tornaram espaços de moda, criadoras de tendências.


Há, por tudo isto, qualquer coisa de fabuloso nos passeios de domingo no Marais. Em primeiro lugar, porque, dada a forte influência judaica, parece ser a única região de Paris que acorda e se move nesse dia. Quem não conhece Paris, estranhará, mas há uma inércia dominical, de tradição conservadora católica que assusta. Quase tudo fecha, e a cidade entra num estado de entorpecimento, só quebrado com a vida fervente de algumas regiões, sendo o Marais, para mim, um destino de excelência.


Para um dia bem passado, e uma caminhada diária que aqui em casa adoramos, aconselho o pequeno almoço no hotel, ou numa boulangerie perto do local onde ficarem, seguido de um passeio matinal pelo Jardin des Tuileries. Entrar no Jardin pelos Champs Elysées, passando o obelisco, e avistar ao longe a imponência do Louvre, aquele que foi, outrora, a residência real e imperial, é, de facto, merecedor de lembrança. Pelo caminho, as fontes e as estátuas mostram-nos a elegância tão distintamente francesa, e podemos ainda avistar, do lado direito, a fachada do Musée d’Orsay, antiga estação de comboios, que nos faz viajar para tempos idos, quando entrar na cidade onde até os relógios são dignos da realeza exuberante devia ser avassalador.


Segue-se então a entrada da Rue du Rivoli, do lado esquerdo do Louvre, que nos transportará ao Marais. Gosto particularmente de deixar para trás o espaço turístico para ver um Paris diferente, que mostra a sua multiculturalidade residente, não a de visita, com o que tem de bom e de mau. Caímos na realidade de uma capital com os seus sem-abrigos que se reúnem, em convívio, a jogar cartas, por cima das grelhas de saída de ar quente do metro, única forma de aguentarem o rigor do inverno francês. Uma realidade que nos acorda do estado inebriado pelo cenário idílico e sumptuoso que tem o Louvre. Ao domingo, as lojas estão fechadas, excepto em alturas específicas do ano, pelo que a nossa atenção poderá estar totalmente focada nas gentes e nos espaços de uma cidade secular. Sem outras distrações, apreciamos a imponência do Hôtel de Ville (Câmara Municipal) e outros espaços históricos pelos quais passamos.


Entramos no Marais, normalmente, pela rua em frente à saída da estação de metro Saint-Paul (fica a dica para quem lá quiser ir ter directamente), e passamos pela maravilhosa Eclair de Génie (delícias caras, mas dignas, pelo menos, de experiência). Perdemo-nos pelas ruas e praças, descobrindo as famosas casas de uma aristocracia esquecida, observando as montras aliciantes e bem cuidadas, até chegarmos à Rue des Rosiers, onde paramos para almoçar algo diferente. Seja um falaffel num dos restaurantes que se afirmam os melhores de todos, sempre nas janelas viradas para a rua, nos quais pedimos o que queremos para comer sentados num degrau de mármore ou num banco do jardim da Place des Vosges, ou uma sandes de Pastrami, na famosa (e fantástica, digo) loja de delicatessen Yiddish Sacha Finkelstein, terminamos sempre com um Sernik, simples ou de sabores, no espaço de fachada amarela. Adoro os almoços “maraisianos”.

De barriga cheia e alma contente, as energias estão recarregadas para visitar uns espaços de arte e história do bairro. O Musée Carnavalet, aberto ao público de terça ao domingo, com entrada gratuita na exposição permanente, é um espaço fantástico para aprendermos mais sobre a cidade da luz, através de pinturas, maquetes, objectos contadores de uma realidade passada, em salões e quartos outrora refúgios de alguém. Famoso, normalmente. Podemos, ainda, aproveitar para visitar a casa de Victor Hugo, na Place des Vosges, intacta e com os móveis ainda no lugar, inspiradores de histórias e estórias de uma vida eterna. A entrada para as colecções permanentes é igualmente gratuita. 

Quando o sol se começa a pôr, nada melhor do que terminar o dia com a travessia do Sena por uma das pontes que separam o Marais da Ilha de Saint Louis, romântico, certo, mas, acima de tudo, regenerante e enternecedor, para encontrarmos uma gelataria de tradição, onde provamos dos melhores gelados artesanais que já comi, a Berthilon. As bolas são mais baratas do que a cadeia multinacional da Haagen Daz, menores também, mas confesso que saboreamos a mestria de uma casa de excelência. E isso faz toda a diferença.


A deliciar-nos pela rua, independentemente da temperatura, chegamos à sumptuosa Notre Dame, cujos sinos à hora certa nos lembram estórias de amantes e ciganas, de paixão e humildade, luta e sacrifício. Paramos à frente da catedral, musa de artistas ao longo dos tempos, e, naquele estado de contemplação terminamos o dia e regressamos a casa. Horas em cheio, mas com uma satisfação por, nelas, termos feito parte e conhecido mais um pouquinho daquilo que é a vida de domingo de uma das cidades mais grandiosas do Mundo.





Fontes:


7 comentários:

  1. Amei o post <3 quero voltar porque ainda me falta conhecer tantaaa coisa do que aqui mostras <3 Beijinho

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Uma das belezas destas cidades grandes é que, quando achas que conheces bem, há todo um mundo que desconheces. :D Beijinho

      Eliminar
  2. O que eu gostei de um domingo no Marais não tem mesura!!
    (Correcção: a mãe da tua amiga é que dizia! Ahahaha)

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Ahahahah pois era, a mãe dela! :D

      tens de voltar para provar a sandes de pastrami e o gelado!

      Eliminar
    2. Ia já, já. Amanhã. Maldito trabalho, raios.
      (há pouco esqueci-me de dizer: as fotografias estão sublimes!)

      Eliminar
  3. Por um bocadinho fui transportada para um hotelzinho na Rue des Archives onde me instalei uma semana, e de onde vi tudo o que consegui, umas vezes com sofreguidão, outras com toda a calma do mundo. O Marais ficou-me na alma. Por isso, e parafraseando a CC, o que eu gostei deste domingo não tem mesura. Obrigada pelo passeio.
    B. MC

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. :) De nada. De facto o Marais tem qualquer coisa de especial.

      Beijinho
      M.

      Eliminar

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...